domingo, 14 de junho de 2009

a única pessoa importante pra mim entre três milhões de desconhecidos e iguais

era um cego andando muito devagar, tentando atravessar a multidão pelas bordas da avenida paulista no meio de um milhão de pessoas. um homem pobre, pobre, velho e maltratado. as mãos grossas e muito sujas se revezavam entre segurar o bastão que são olhos e tatear um corrimão que protege a calçada da rua, em busca de um caminho para não se sabe onde. mas um caminho por onde andar, protegido. (de quê?). provavelmente ele não podia nem imaginar o que seus olhos veriam ali, se vissem. talvez, caso ele saiba o que é uma guerra, estivesse com a sensação de estar no meio de uma. a passos de tartaruga - ou de bebê frágil e indefeso - ele avançava num ritmo alheio e único: que me esfaqueava o peito a cada movimento, que me deixava cada nervo do corpo exposto instantaneamente. que dor. que dor profunda e insuportável. as ruas imundas e a minha vida devastada.

ele passou por mim sem fazer idéia de que naquele instante tomava e levava consigo toda a minha chance de felicidade para sempre. como um ímã ele tomou de mim a alegria, qualquer que houvesse, e eu fui invadida por uma tristeza em cascata que me desmontou num segundo em choro e soluço. lá estava eu, num pranto repentino, desamparada e destruída pela visão daquele homem que não vê, naquela situação.

a minha impotência diante daquela cegueira absolutamente solitária e invisível em meio a touros desesperados na arena me doeu como se me arrancassem os olhos com dois pegadores de gelo. foi um frio, mas um frio tão duro bem direto na minha testa, que me perfurou a cabeça e me congelou a alma.

assim mesmo, com essa força que não cabe nas piores palavras.

desde então, nada me consola.
mais uma vez, como tem sido a vida inteira.
por que, meu Deus (?) por quê?

orgulho?
orgulho de quê?

cego é aquele que não quer ver.
era um cego andando muito devagar e tentando atravessar a multidão cega.
cego é aquele que vê e nada faz.

eu.
a pior de todas.

que Deus abençoe o senhor,
se é que eu tenho o direito de pedir alguma coisa,
enquanto choro.

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